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Adoção de descendente por ascendente

Adoção de descendente por ascendente

A legislação brasileira permite a adoção de neto pelos avós?

O pedido de adoção de menor no Brasil é um procedimento regulado por vários dispositivos legais nacionais e internacionais que delimitam e estabelecem as limitações ao direito de adotar.

É bastante comum não só no Brasil, como  em vários países do mundo, aquela situação em que os avós efetivamente é que exercem na prática o poder familiar atuando ativamente na criação e educação do neto.

É uma queixa comum de casais que, mesmo exercendo a paternidade sócioafetiva do(a) neto(a) desde o nascimento, criando-o(a) como se filho fosse, não podem adotá-lo(a) por conta do dispositivo de lei  constante no Estatuto da Criança de Adolescente que proíbe adoção por ascendentes.

O que prevê a legislação?

Nos termos do § 1º do artigo 42 da Lei 8.069/90 – Estatuto da Criança e Adolescência, ascendentes e irmãos do adotando não podem adotar no Brasil, senão vejamos:

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Art. 42 Podem adotar os maiores de 18 anos, independentemente do estado civil.

§ 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.

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Com base nesse dispositivo de lei, até poderíamos concluir que avós não podem adotar netos, só que, com base  em outros dispositivos de leis nacional e internacional, bem como, do princípio que sempre prevaleceu em casos envolvendo menores, qual seja, o do maior interesse da criança, essa interpretação está sendo,  em alguns casos, relativizada.

Os dispositivos legais e convenções que são usados para fundamentar pedidos dessa natureza estão a seguir transcritos, senão vejamos:

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CONSTITUIÇÃO FEDERAL

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 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

 

LEI 8.069/90 ALTERADO PELA LEI 12.010/2009- ESTATUTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE

………..

 Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

………………………..

 Art. 6º Na interpretação desta lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

……………………………….                                 

Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.

……………………………

Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.

Parágrafo único.  São também princípios que regem a aplicação das medidas

I – ……………..

…………………………

IV – interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;   

 

CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA PROMULGADA PELO DECRETO PRESIDENCIAL NO 99.710, DE 21 DE NOVEMBRO DE 1990.

…….

Art. 3º

1 - Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.

 

Princípio do maior interesse do adotando nos casos de adoção de descendente por ascendente (avós adotando neto)

Diante do princípio do maior interesse da criança previstos nos dispositivos legais acima transcritos, os tribunais superiores tem acompanhado essa visão e relativizado a interpretação do § 1º do artigo 42 que proíbe a adoção por ascendentes, uma vez que estão convalidando decisões de instâncias ordinárias que tem concedido o direito de determinados ascendentes adorem seus netos em algumas circunstâncias, conforme pode ser aferido através da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça no Recursos Especial nº 1448969/SC a seguir transcrita:

 

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

REsp. 1448969/SC

Relatora: Min. Maura Ribeiro

Terceira Turma  – DJe 03/11/2014

 

EMENTA

 

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ADOÇÃO C/C DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR MOVIDA PELOS ASCENDENTES QUE JÁ EXERCIAM A PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. SENTENÇA E ACÓRDÃO ESTADUAL PELA PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. MÃE BIOLÓGICA ADOTADA AOS OITO ANOS DE IDADE GRÁVIDA DO ADOTANDO. ALEGAÇÃO DE NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, OBSCURIDADE OU CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. SUPOSTA VIOLAÇÃO DOS ARTS. 39, § 1º, 41, CAPUT, 42, §§ 1º E 43, TODOS DA LEI N.º 8.069/90, BEM COMO DO ART. 267, VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INEXISTÊNCIA. DISCUSSÃO CENTRADA NA VEDAÇÃO CONSTANTE DO ART. 42, § 1º, DO ECA.  COMANDO QUE NÃO MERECE APLICAÇÃO POR DESCUIDAR DA REALIDADE FÁTICA DOS AUTOS. PREVALÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DA GARANTIA DO MELHOR INTERESSE DO MENOR. ART. 6º DO ECA. INCIDÊNCIA. INTERPRETAÇÃO DA NORMA FEITA PELO JUIZ NO CASO CONCRETO. POSSIBILIDADE. ADOÇÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.

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 1 – Ausentes os vícios do art. 535, do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração;

 2 – As estruturas familiares estão em constante mutação e para se lidar com elas não bastam somente as 

 leis. É necessário buscar subsídios em diversas áreas, levando-se em conta aspectos individuais de cada

 situação e os direitos de 3ª Geração;

 3 – Pais que adotaram uma criança de oito anos de idade, já grávida, em razão de abuso sexual sofrido e,

 por sua tenríssima idade de mãe, passaram a exercer a paternidade socioafetiva de fato do filho dela,

 nascido quando contava apenas 9 anos de idade;

 4 – A vedação da adoção de descendente por ascendente, prevista no art. 42, § 1º, do ECA, visou evitar

 que  o instituto fosse indevidamente utilizado com intuitos meramente patrimoniais ou assistenciais, bem

 como buscou proteger o adotando em relação a eventual “confusão mental e patrimonial” decorrente da

 “transformação” dos avós em pais;

 5 – Realidade diversa do quadro dos autos, porque os avós sempre exerceram e ainda exercem a função de

 pais do menor, caracterizando típica filiação socioafetiva;

 6 – Observância do art. 6º do ECA: na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela

 se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar

 da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento;

 7 –  Recurso especial não provido.

Conclusão

Concluindo, o que se pode constatar é que, em determinados casos onde a paternidade socioafetiva esteja sendo realmente exercida pelos avós, é perfeitamente possível o pedido judicial de adoção pelos ascendentes(Avós).

Não estamos aqui afirmando que esse entendimento é unânime ou mesmo que exista uma jurisprudência pacífica junto ao Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria, mas por outro lado podemos assegurar que, se for do maior interesse da adotando, existe uma boa chance do pedido ser convalidado pela justiça brasileira.

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